O elefante na sala: o maior risco da inteligência artificial pode não ser aquilo que pensamos

Questione Tudo
4 min readJan 2, 2023

Numa carta aberta, assinada por nomes célebres, como Stephen Hawking e Ellon Musk, inúmeras lideranças na área da ciência e da tecnologia e da ciência emitiram um alerta a respeito dos riscos representados pela inteligência artificial, citando, entre outros, dilemas éticos, como no caso de carros autoguiados, assim como o desemprego em massa. Os riscos, contudo, podem ter uma causa não apenas distinta, mas atingirem num nível muito maior do que o próprio texto considera.

Com uma taxa de crescimento anual de 38% em aumento na estimativa de valor de mercado, a inteligência artificial progride num ritmo vertiginoso, que fazem do crescimento do PIB da China assemelhar-se aos passos de uma tartaruga. Tal representativa é essa taxa de crescimento, de fato, que ela representa, no curso de 10 anos, um aumento de 25 vezes no tamanho do mercado. E, conforme dita a matemática, de nada menos que 625 vezes num período de 20 anos, se tal crescimento persistir. Estamos, é claro, com isso, referindo-se apenas a força econômica direta exercida pela inteligência artificial, sem considerar, por exemplo, os, certamente, imensos impactos que tal expansão representam em inúmeras áreas, desde o mercado de trabalho, já mencionado, riscos econômicos (seja pela grande transferência de investimento súbida para esse setor, retirada de outros, ou por uma queda repentina dos lucros obtidos no mesmo), riscos ambientais, contribuindo para o aquecimento global e para a supersaturação de recursos naturais (devido as exigências para a produção de supercomputadores que as rodem), para não mencionar os riscos de cunho geopolítico (como o crescimento é exponencial, o primeiro país ou empresa a detê-la ficará absurdamente a frente das demais) ou ligado a conflitos entre países, assim como de ordem social, psicológica e cultural, provocada pela mudança vertiginosa com que tais tecnologias surgiram.

Com uma taxa de crescimento tão vertiginosa, podemos imaginar tais mudanças ocorrendo já dentro de um intervalo curtíssimo, algo num prazo de 5 a 10 anos, possivelmente, e de forma quase certa para o prazo das próximas décadas.Apesar disso, mesmo com todas essas ameaças, entretanto, o tema segue sendo discutido num nível apenas superficial na mídia, sendo testa e planejada, em geral, por empresas de grande porte e governos, longe dos holofotes, e sem participação ou acompanhamento ou escrutínio do público, que não parece ter conhecimento da seriedade do tema, a ponto de, seja o ex-presidente ou o atual presidente, para mencionar o caso particular do Brasil, pouco terem abordado o tema na campanha ou discurso de pose. Temos, consequentemente, uma situação paradoxal, onde quanto mais se pesquisa e se busca o assunto, dentro do meio acadêmico e de empresas de tecnologia, menos ele é debatido, e menos meios de mecanismos democráticos ou da população participar, são considerados.

Consideramos, entretanto, que o maior risco representado pela inteligência artificial não tenha relação direta com o seu potencial, por si mesmo, mas o seu uso dentro do contexto de uma economia moderna. É reconhecido que, dentro de uma economia orientada para o aumento de capital, inúmeros setores passam a agir como se tivessem “vida própria”, sendo mantidos mesmo com a ciência de inúmeros malefícios causados, pelo simples fato de que fazê-lo é “lucrativo”, “negócios são negócios”. Como exemplo mais que sabido, temos a relação entre a indústria de combustíveis fósseis, petróleo e carvão, com o aquecimento global. A seriedade do tema, e a necessidade urgência na redução de medidas visando a redução da emissão de gases causadores de efeitos estufa, é reconhecida não apenas por climatologistas, sendo basicamente consenso entre os mesmos, mas também recebendo grande apoio da população, assim como líderes globais e até mesmo de diversos milionários.O mesmo podendo ser dito sobre a seriedade da recentemente enfrentada pandemia do COVID, no qual, mesmo sendo sabido dos imensos riscos do afrouxamento das medidas de distanciamento social, o mesmo foi efetuado em nome de “forças econômicas”.

Desse modo, mesmo com toda a gravidade apresentada, o tema segue, em larga parte, ignorado e com pouquíssima cobertura da imprensa ou medidas concretas para sanar a questão. Nem é preciso, é claro, mencionar toda uma infinidade de “tragédias” ambientais ou sociais causadas, indiretamente, pelas mesmas “forças do mercado”.

Assim, percebemos que o risco da inteligência artificial NÃO se dará pela criação acidental e espontânea de uma superinteligência monstruosa, que escape do controle humano e que, dessa forma, nos destrua e subjulgue, como poderíamos pensar numa história em quadrinhos. Pelo contrário, defendemos que inteligências artificiais, com imenso potencial maléfico, continuarão sendo produzidas, com conhecimento da parte daquelas que a detém, pura e simples porque os seus detentores assim o desejarão, pois, para aqueles envolvidos, tal processo se revelará imensamente lucrativo, e, com o poder econômico envolvido, os danos externos causados, apesar de conhecidos, serão negligenciados, já que seus beneficiários deterão o poder e, suas vítimas, não.

Apontamos, dessa forma, para a imensa contradição, em que, enquanto prega-se e alardeia, mundo a fora, a necessidade de democracia e de participação popular, as tecnologias que, efetivamente, definirão nosso destino seguem concentradas em pouquíssimas mãos, de umas poucas empresas e bilionários, do modo mais autoritário possível.

Desse modo, concluímos sobre a necessidade, imediata, da tomada de providências no sentido de estimular o debate, a conscientização, e, mais fundamental que tudo, a democratização do controle da criação e desenvolvimento de tecnologias ligadas a inteligência artificial. Passo que impactará no destino de toda a humanidade.

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